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Dos gabinetes altos e húmidos

Dos gabinetes altos e húmidos

O Estado precisa de pessoas competentes que não fiquem reféns do emaranhado dos decretos e portarias e estejam dispostas a procurar soluções no quadro legal.

O Programa Revive é o Estado e a Administração Pública a funcionarem como nós gostaríamos que funcionassem sempre. Nem parece verdade, mas é verdade.

Como é possível que uma iniciativa do Estado, que envolve vários ministérios, em colaboração com autarquias locais e a coordenação do Turismo de Portugal, consiga de forma célere promover e agilizar a reabilitação e valorização de património público que se encontra devoluto, através da concessão a privados da sua exploração por concurso?

Os detratores, do quadro de maledicência definitiva, dirão que este programa não é original, mas apenas uma réplica ou continuidade do velho programa Pousadas de Portugal. Sim, até pode ter alguma influência, mas o certo é que resolveu um nosso problema antigo de um solar setecentista de Paredes de Coura que se deteriorava de ano para ano, sem fim à vista.

A partir do momento que decidimos integrar o Solar Casa do Outeiro neste programa, tudo aconteceu de forma rápida, porque contámos com a ajuda e o pragmatismo de todos os parceiros da administração pública. Na cerimónia de Paredes de Coura, Teresa Monteiro, do Turismo de Portugal, adiantou que as 20 concessões adjudicadas, desde do arranque do programa em 2016, representaram um investimento privado estimado em cerca de 149,5 milhões de euros e rendas anuais para o Estado na ordem dos 2,5 milhões de euros. 

Isto só foi possível, porque, como disse a secretária de Estado do Turismo, Rita Marques, os privados têm confiança na estratégia seguida, bem como no futuro do setor. E têm confiança, porque toda a gente que está envolvida neste programa coopera, trabalha e arregaça as mangas sem ter medo de exercer as suas competências.

O Estado precisa de pessoas competentes que não fiquem reféns do emaranhado dos decretos-lei e das portarias e estejam sempre dispostas a exercer o poder e a procurar soluções dentro do quadro legal. Se ninguém quiser correr riscos e não mexer muito para não cometer erros, então não nos restará mais do que um Estado distante, solitário, lento e ineficiente com o seu escol acomodado e entrincheirado com medo de fazer, enquanto se espera pela reforma ou por uma promoção por serenidade profissional.

Precisamos, pois, de um Estado que decida. De governantes pragmáticos, com capacidade de decisão, e de administradores e diretores diligentes que não se refugiem na eterna mediocridade irónica do “eles vêm e vão e nós continuamos cá”. Sim continuam lá, à espera do final do dia, enquanto cheiram os fungos dos gabinetes altos e húmidos. Porque diz a tradição que o sossego e a falta de movimento reduzem, substancialmente, o erro ou a probabilidade de arranjar problemas. 

Precisamos de administradores e diretores que não se refugiem na mediocridade irónica do “eles vêm e vão e nós continuamos cá”. Sim, continuam lá, à espera do final do dia, enquanto cheiram os fungos dos gabinetes altos e húmidos

O Programa Revive é um exemplo da boa administração pública. É um bom exemplo de velocidade institucional e de cooperação na procura de novas soluções jurídicas que facilitam a regulação e inclusão de mais intervenientes, em articulação com o Estado, garantindo assim a promoção do desenvolvimento económico e cultural do país através da recuperação do património.

Se não tivermos esta consciência, a degradação institucional, burocrática e silenciosa da administração pública continuará a alimentar a contestação social, num mundo em mudança em que reformar é cada vez mais difícil. Quanto mais tempo demorarmos, mas exigentes e difíceis serão as reformas. Melhorar o desempenho institucional, através da criação de programas que estimulem a economia e criem riqueza, é o grande desafio. O Revive é um bom exemplo de como o sector público trabalha bem, rapidamente, e em parceria com os privados. Quando é assim o país agradece.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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