sol.sapo.ptGonçalo Morais - 25 mai. 14:48

É para isto que lhes pagamos?

É para isto que lhes pagamos?

O mais irónico é que André Ventura até estava a fazer um elogio aos turcos. Quem transformou aquilo numa peixeirada é que deve ser responsabilizado pelo circo em que se transformou a Assembleia da República.

O aeroporto de Istambul foi construído e operacionalizado em cinco anos, e os turcos não são propriamente conhecidos por ser o povo mais trabalhador do mundo», disse André Ventura no Parlamento, provocando uma arruaça. Um deputado do BE, Fabian Figueiredo, uma deputada do PS, Alexandra Leitão, e uma terceira do Livre, Isabel Mendes Lopes, queriam que o presidente da AR, Aguiar-Branco, calasse o deputado e o proibisse de continuar a falar – o que ele se recusou a fazer.

«Não serei eu o censor de nenhum dos deputados», afirmou Aguiar-Branco.

E muito bem.

Cada deputado é livre de dizer o que entende, ponto final.

O juízo sobre aquilo que diz será feito pelos eleitores ou pelos tribunais, se for caso disso.

Se os jornais podem escrever o que querem, não sendo sujeitos a censura prévia, por maioria de razão os deputados eleitos pelos portugueses devem dizer livremente o que pensam.

Aqueles que querem silenciá-los são os mesmos que sempre ansiaram por uma censura, eventualmente de sinal contrário àquela que tínhamos no passado.

O certo é que, por algum tempo, a Assembleia da República transformou-se num circo. E eu pergunto: de quem terá sido a culpa? O que aconteceria se esses deputados tivessem ficado calados? Viria algum mal ao mundo?

André Ventura estava a falar do novo aeroporto de Lisboa, e referiu os turcos en passant, para os apresentar como exemplo: se, mesmo não sendo os mais trabalhadores do mundo, eles construiram o aeroporto de Istambul em cinco anos, nós também o poderemos fazer.

Era este o sentido da sua intervenção.

Mas três deputados – do BE, do PS e do Livre – decidiram fazer a propósito disto um ‘caso’.

Claro que André Ventura agradeceu.

Mais uma vez esteve no centro de uma polémica, sob a luz dos holofotes, no papel de vítima.

Os outros partidos ainda não perceberam que, quanto mais lhe batem, mais votos lhe dão.

E depois as pessoas pensam: é para isto que servem os deputados?

É para gastarem o tempo a discutir se se pode dizer que os turcos são muito ou pouco trabalhadores?

Foi para isto que os elegemos?

Valha-nos Deus!

O que é também lamentável na atitude daqueles três parlamentares é a submissão ao politicamente correto. É o cinismo, a tentativa de esconder o óbvio, de tapar o sol com uma peneira. Será crime dizer que um povo é mais ou menos trabalhador?

Os povos, porventura, são todos iguais?

Os europeus são iguais aos orientais?

Os nórdicos são iguais aos latinos?

Os alemães são iguais aos gregos?

E se os povos têm características diferentes, não é normal que uns sejam mais trabalhadores, outros mais imaginativos, outros mais alegres, outros mais hospitaleiros, e assim sucessivamente, sem que isso implique dramas nem complexos?

Que mal há em reconhecer isto?

Custa-nos muito admitir, por exemplo, que os ingleses são mais empreendedores do que nós?

Basta olhar para a História e ver que foram eles que criaram muitas das nossas principais indústrias.

O vinho do Porto foi inventado, produzido e comercializado por ingleses. O vinho da Madeira, idem, aspas. Muitas das nossas minas foram montadas e exploradas por ingleses. A nossa indústria vidreira foi criada por ingleses…

Custa alguma coisa reconhecer isto?

É preciso ter muita cultura ou muita inteligência para saber e compreender esta realidade?

Será que certas pessoas são mesmo burras ou querem fazer de nós burros?

Sejamos sérios: Ventura disse uma coisa absolutamente anódina. Quem a transformou numa tempestade, fazendo uma despropositada peixeirada, é que deve ser condenado e responsabilizado. Não foi André Ventura que esteve mal. Não foi Aguiar-Branco que esteve mal – pelo contrário. Quem esteve mal foram os três deputados do BE, do PS e do Livre, que devem ser culpabilizados por aquelas perdas de tempo, por aquela discussão estéril que não conduzia a nada nem interessava nada, e apenas dizia respeito aos seus complexos políticos e mesquinhez ideológica.

E que, além disso, desprestigiam o Parlamento e a função de deputado.

Os portugueses perguntam-se: será para isto que lhes pagamos?

P.S. – Isabel Moreira, numa entrevista à Rádio Observador, acusou deputados do Chega de a insultarem. Ora, nesta coluna, apenas posso comentar o que se passa no hemiciclo e não as trocas de palavras entre deputados nos bastidores do Parlamento.

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