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Para quando um quadro legal para a protecção do mar português?

Para quando um quadro legal para a protecção do mar português?

Sabendo onde queremos estar em 2030 – daqui por pouco mais de 7 anos. Mas como lá vamos chegar, como vamos atingir a protecção efectiva de 30% das áreas mais importantes do espaço marítimo nacional?

Na Conferência do Oceano das Nações Unidas, que decorreu este ano em Lisboa, mais de 100 países, entre os quais Portugal, comprometeram-se a proteger 30% ou mais do seu mar até 2030 – em linha com a meta “30 x 30” (30% de protecção até 2030) do novo quadro global para a biodiversidade pós 2020 da Convenção da Nações Unidas sobre a Diversidade Biológica (CDB), que deverá vir a ser formalmente adoptado em Dezembro deste ano na 15ª Conferência das Partes (COP) da CDB.

Esta importante meta visa travar e, idealmente, reverter a continuada perda de biodiversidade global, reforçando a protecção dos ecossistemas e a diversidade e abundância de espécies, algumas muito ameaçadas. No caso específico do meio marinho, esta meta de conservação contribui também, simultânea e directamente, para apoiar a revitalização do sector das pescas, que sustenta parte significativa da humanidade. Só poderá haver pescado com qualidade e em quantidade com um oceano saudável e cheio de vida.

Sabendo onde queremos estar em 2030 – daqui por pouco mais de 7 anos. A pergunta que se impõe é como lá vamos chegar, como vamos atingir a protecção/conservação efectiva de 30% das áreas mais importantes do espaço marítimo nacional – o chamado mar português – até 2030? A concretização deste objectivo pressupõe, no essencial, os três pontos seguintes:

Primeiro, os números: de acordo com dados oficiais publicados em 2019, a protecção total do mar português era, à data, de cerca de 4 % até ao limite da Zona Económica Exclusiva (ZEE) e de 7 % até ao limite da Plataforma Continental Estendida. De então para cá, o aumento de área protegida no mar português, mesmo com a considerável ampliação da área de protecção total das Ilhas Selvagens na ZEE da Madeira, não alterou significativamente a percentagem total de protecção no nosso mar. Para alcançarmos a meta “30 x 30” temos pouco mais de 7 anos para mais do que triplicar a actual área de protecção.

Depois, como assegurar que estes 30% abarcam os ecossistemas e biodiversidade marinha mais importantes no mar português? O grupo de trabalho sobre áreas marinhas protegidas (AMP) criado em 2017 pela então Ministra do Mar, Ana Paula Vitorino, compilou a informação disponível incluindo “sobre novas áreas com potencial valor ecológico para efeitos de classificação”. Apesar de profundas lacunas de conhecimento sobre os ecossistemas marinhos (uma dificuldade global), a informação científica de que dispomos actualmente permite demarcar áreas consideradas mais importantes para a conservação de espécies e habitats marinhos no mar português.

Finalmente, é preciso garantir o enquadramento jurídico que estabeleça mecanismos para a classificação e gestão efectiva destas áreas protegidas. Em 27 de Agosto de 2015, o conselho de ministros do XIX Governo Constitucional de Portugal (com Assunção Cristas como Ministra da Agricultura e do Mar) aprovou um diploma que estabelecia “o regime jurídico aplicável à classificação e gestão de áreas marinhas protegidas no solo e subsolo marinho e na coluna e superfície de água para além do mar territorial”. Com este diploma, as AMP classificadas eram “integradas na Rede Fundamental da Conservação da Natureza” e era reforçada a articulação entre as várias entidades relevantes, nomeadamente a Direcção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM), a Autoridade Nacional para a Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNF) e ainda as Regiões Autónomas, no caso das AMP nas zonas marítimas adjacentes aos arquipélagos dos Açores e da Madeira, até ao limite das respectivas ZEE. O correspondente comunicado do conselho de ministros refere ainda que a classificação e a gestão de AMP “são encaradas como uma prioridade nacional e correspondem ao cumprimento das obrigações internacionais assumidas por Portugal, enquanto Estado costeiro, no quadro do exercício dos seus direitos de soberania e jurisdição”.

Inexplicavelmente, este diploma que enquadrava legalmente esta “prioridade nacional” está, há mais de 7 anos, por publicar, o que bloqueia o “cumprimento das obrigações internacionais assumidas por Portugal”.

A COP 15 da CDB será um excelente marco para Portugal publicar um tal diploma, estabelecendo assim, finalmente, as condições legais para podermos avançar com a protecção efectiva de 30% do nosso mar até 2030. Assim, Portugal poderá assumir de novo um papel de destaque a nível mundial na governação do oceano, desta feita numa perspectiva de protecção da biodiversidade marinha, um legado vital para as próximas gerações. Conseguiremos fazê-lo?

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