www.publico.ptpublico@publico.pt - 28 nov. 14:52

Que orçamento para a Saúde?

Que orçamento para a Saúde?

O grande problema deste orçamento é que ignora o ponto de partida, ignora que 2022 não correu como planeado.

No que se refere à Saúde em Portugal, todos se queixam e todos têm razão. Os problemas foram-se multiplicando e acumulando ao longo do tempo, dificultando muito o desenho da solução. O recém-aprovado Orçamento do Estado (OE) para 2023 não vem ajudar muito, apesar de traçado num contexto ideal, de maioria absoluta, e do crescimento recorde atribuído à Saúde.

Um dos maiores erros deste orçamento não é falta de boas ideias para o ano que se avizinha. O grande problema é que ignora o ponto de partida, ignora que 2022 não correu como planeado e que ao longo deste ano perdemos muito em nível de vida. O orçamento até traz respostas interessantes, mas são curtas, principalmente quando olhamos para de onde vimos.

A área da Saúde não foge à regra. Sofredora de suborçamentação há anos, sob forte pressão dos fornecedores, cansados de pagamentos tardios, com medicamentos cada vez mais caros face aos (incríveis) avanços da medicina e mais procurados, dada a crescente esperança média de vida (apesar do ligeiro abrandamento com a covid), com profissionais extremamente desmotivados a fugir para o privado, ou mesmo para outros países, a Saúde no nosso país já viu melhores dias.

Acresce a escassez de materiais e medicamentos, a inflação generalizada, a urgente necessidade de investimento em tecnologias de informação, a difícil gestão de tesouraria, os constrangimentos associados à contratação pública que dificultam a execução de investimento e a dependência governamental na gestão, nomeadamente, ao nível de recursos humanos.

Aguarda-se com ansiedade a definição estratégica da recém-criada estrutura de gestão da Saúde em Portugal. Mas, apesar de os mais altos de sempre, os montantes afetos à Saúde no OE 2023, mais 2,9% para recursos humanos, e mais 3,7% para bens e serviços, não antecipam facilidades na resolução dos problemas elencados.

Como se disse, os profissionais de saúde, afetos a uma profissão esgotante, revelam fortes sinais de cansaço e desmotivação. Em 2022, os salários já pouco atrativos, caíram em termos reais cerca de 8%. Com uma inflação esperada de 5,1% para 2023, os aumentos salariais projetados para 2023 ficarão longe do retorno ao salário real de 2021. Se não conseguirmos reter os que cá estão, como vamos poder atrair novos médicos? É urgente rever a estratégia de RH na Saúde, visando o mérito, a valorização dos profissionais e a retenção de talento.

A aposta no investimento em equipamento técnico e em IT tem que passar da inscrição de valores num orçamento. A execução orçamental tem que se aproximar dos 100% pois ficar sistematicamente muito aquém do investimento estratégico projetado para a Saúde atrasa-nos em inovação e em rapidez de resposta aos nossos doentes. E, para retirar o melhor partido desses investimentos, há que apostar em formação e investigação.

Para que o bolo na Saúde não engorde em demasia, é preciso gerir recursos de forma mais eficiente. A aposta na transição digital tem que ser visível e os efeitos da avaliação com base em objetivos de equipa têm que avançar. Urge encarar sem tabus reestruturações em empresas públicas, reestruturações que satisfaçam quer as unidades de saúde, quer os profissionais que sentem vontade de abraçar outros projetos, para os quais uma indemnização por cessação de contrato de trabalho pode ser a solução.

A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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