observador.ptObservador - 6 dez. 00:05

O Jogo do Ganso

O Jogo do Ganso

A vacina tornou-se um acto de fé inabalável. Em actos de fé, não faz sentido fazer perguntas. É o lema fascista aplicado à saúde, “acreditar, obedecer, lutar”.

Tem acesso livre a todos os artigos do Observador por ser nosso assinante.

Lembram-se do Jogo do Ganso, o concurso transmitido pela TVI, na altura canal 4, em meados dos anos noventa, no qual os concorrentes eram os peões de um tabuleiro gigante com sessenta e três casas? Nele, os concorrentes eram submetidos a todo o tipo de provas e desafios e, na maior parte das vezes, o jogo parecia estar a correr bem, até que os dados eram de novo lançados e a sorte ditava que tinham de voltar ao início. Tentavam de novo. E então novamente e novamente.

É assim que funciona a Covid-19. Há um aumento de infecções, de internamentos e de óbitos, independentemente de a percentagem de pessoas inoculadas ser de 60%, 90% ou de 100%. Segue-se uma nova variante, Delta, Lambda, Épsilon ou Ómicron, que é anunciada com a mesma ênfase que seria dada a uma invasão alienígena, isto é, com medo suficiente para justificar novas medidas restritivas, mas não o suficiente para considerar a vacinação inútil. Depois entra em acção uma enxurrada de especialistas – o tamanho do ganso – que nunca acertam. E eis-nos de novo obrigados a voltar ao ponto de partida, como os gansos, mas muito mais histéricos do que aqueles animais sábios e equilibrados.

Mas será o vírus que dita as regras do jogo? Obviamente que não. Toda a história da pandemia começou por ser vivida como tragédia e depois como farsa, parafraseando Marx em O 18 de Brumário de Luís Bonaparte.

Daqui resulta, que o problema nunca foi o dos portugueses que não estendem o braço em nome da Pátria, ou das futuras Antígonas que terão de escolher entre proteger os filhos ou a cidade. São ridículas, aliás, as vozes que continuam a descarregar as suas frustrações em cima dos “negacionistas” – uma espécie de homem branco de Pascal Bruckner. Este assunto ficou resolvido no artigo de Günter Kampf, publicado na revista The Lancet, no qual explica que “o risco de contágio para as pessoas vacinadas começa a aumentar noventa dias após a segunda dose”. O problema é a perda de eficácia das vacinas e o facto de a vacinação em massa favorecer a selecção de variantes mais resistentes ao vírus.

Mas se considerarmos que a campanha de vacinação decorreu antes ou durante o Verão, quantos milh��es de potenciais infectantes circulam com um certificado digital que nada diz sobre o seu estado de imunização? E se a isso acrescentarmos o facto de apenas oitocentas mil pessoas terem recebido até ao momento a dose de reforço, que outra condição nos resta senão aquela do jogo do ganso? Então eu me pergunto para onde foi a variante inteligente, os jornalistas, intelectuais e constitucionalistas livres, dotados de espírito crítico, mas animados por um forte compromisso civil.

NewsItem [
pubDate=2021-12-06 01:05:02.0
, url=https://observador.pt/opiniao/o-jogo-do-ganso/
, host=observador.pt
, wordCount=462
, contentCount=1
, socialActionCount=0
, slug=2021_12_06_715714360_o-jogo-do-ganso
, topics=[opinião, coronavírus, saúde, liberdades]
, sections=[opiniao, sociedade]
, score=0.000000]