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Não me venham falar do Natal

Não me venham falar do Natal

Entrou em vigor, a meio da semana passada, uma resolução do conselho de ministros onde ficou declarado o "estado de calamidade" até ao início da Primavera de 2022. Sobre os aspectos juridicamente controversos deste diploma, o bastonário da Ordem dos Advogados e professor da Faculdade de Direito de Lisboa, Luís Menezes Leitão, já escreveu o essencial. E o essencial é a implantação de um "estado de excepção", uma vez que as medidas "vão muito mais longe do que a própria Constituição permite em relação ao estado de emergência".

Daí que a aplicação da resolução devesse ser efectuada com bom senso, nomeadamente pelos burocratas da DGS. Todavia, o que é que sucedeu em apenas cinco dias? Para prevenir uma pandemia que "vive" da sociabilidade desmesurada, onde se recomenda designadamente o distanciamento social, o sistema, não satisfeito com os certificados de vacinação, passou a exigir testes para, por exemplo, visitar institucionalizados, hospitalizados ou utentes de lares e residenciais geriátricas. Testes e autotestes que desapareceram num instante até dos supermercados. O que obriga - tem obrigado - estas pessoas a juntarem-se a filas e filas, por todo o lado, à porta de laboratórios, farmácias e centros de testes, indistintamente com os que, de forma legítima, querem ir divertir-se ou à bola. Sucede que as pessoas naquelas condições têm, perante os seus familiares ou próximos, um direito e uma obrigação naturais (naturais porque não resultam directamente de "normas" jurídicas ou administrativas) de estar com os seus, doentes ou em final de vida, com responsabilidade e afecto. Usar as "normas" como acto de prevenção, nestes casos, é de uma violência psicológica inaudita, quando os funcionários e trabalhadores de algumas instituições são testados cada quinze dias ou ao mês. Se um teste é válido por 72 horas, ao fim de 24 ou 48 quem é que pode garantir que o testado não se infectou entretanto? Por outro lado, veja-se o caos nos aeroportos nacionais, ainda ontem descrito neste jornal pelo escritor José Eduardo Agualusa que chegava de Moçambique a Lisboa. Oitenta e cinco euros por um teste, para quem não vier munido de um, é obra. Não escondo, como rigoroso cumpridor de tudo há quase dois anos, que isto me diz respeito. Por isso, e por achar ter uma vozinha contrariamente à maioria sem ela, tentei explicar ao presidente da República e ao primeiro-ministro estas incongruências. Este remeteu-me para a DGS numa curta conversa amável entre dois velhos conhecidos. E Marcelo, a última vez que o vi foi numa fotografia. Tirava uma selfie, com uns escuteiros, na Estrela. É o que há. Não me venham falar do Natal.

Jurista

o autor escreve segundo a antiga ortografia

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