www.sabado.ptleitores@sabado.cofina.pt (Sábado) - 17 set. 15:43

Conversa de ocasião

Conversa de ocasião

Por isto enquanto não se avançar decididamente neste sentido e continuarmos na mera manifestação de intenções a conversa será boa mas não passa disso. - Teófilo Santiago , Sábado.
De quando em quando e de uma forma que nunca afasta a desconfiança, pela oportunidade, lá vem uma nova onda, mais discursiva que outra coisa, sobre a necessidade, méritos e juridicidade da "colaboração premiada" que alguns (muitos) teimam em chamar viperinamente de "delação premiada", como instrumento decisivo no combate à corrupção.

Mais desafiado que instado, por pessoas que muito prezo e respeito pela sua experiência e saber, a emitir opinião sobre o tema fui resistindo com aquele que é argumento irrebatível - já tudo foi dito e em prosa apurada sobre o assunto, quer por aqueles de quem partilho a opinião da necessidade/essencialidade da consagração legal dum estatuto favorável para o arguido que colabora activamente e de forma decisiva para o desmantelamento de uma organização criminosa e, importante, repõe todos os benefícios que retirou ilicitamente enquanto durou a sua actividade criminosa inserido na organização criminosa que ajudou a desmantelar ou noutros actos criminosos em que tenha participado e, também, por aqueles que com todo o seu peso e poder usam argumentos em prejuízo da existência dum estatuto que repudiam.

Estava nesta posição cómoda quando alguém me lembrou que seria positivo conhecer também a opinião de quem, por azar ou sorte, se confrontou durante a sua actividade de investigador com o crime organizado e com o combate ao crime económico e à corrupção em particular e, assim, vi-me recuado aos fins dos anos 80, inícios dos anos 90, do século passado onde a questão, dos então chamados "arrependidos", já se punha então no combate ao tráfico internacional de drogas proibidas e com a mesma premência que hoje se coloca relativamente ao combate ao crime económico e à corrupção e que naquele tempo me levou a escrever uma obra a que chamei "Informadores – entre a necessidade e a hipocrisia " onde se mostra que já em 1993 se discutia a questão dos benefícios a conceder pela Justiça aos criminosos que acabam a colaborar, de forma relevante, com ela.

No entanto de tudo o que ali escrevi e reescreveria agora a frase que mais vezes me ocorre quando estas questões se levantam é "…e no entanto muitas vezes o "arrependido " arrepende-se de se ter arrependido" e tudo porque, então como agora, de pouco servem as promessas e/ou garantias dadas pela Polícia e Ministério Público, mesmo com a anuência e compreensão do Juiz de Instrução Criminal, se depois, no mais importante e que mais interessa - o julgamento - isso ou pouco na conta para a decisão final.

Não é sério e não dignifica a Justiça e daí a absoluta necessidade de se criar um mecanismo legal que garanta a concretização dos compromissos assumidos por todas as partes durante a investigação (que é a fase em que a colaboração do arguido mais releva) e avalizadas por um Juiz, após ponderação dos interesses em jogo.

Por isto enquanto não se avançar decididamente neste sentido e continuarmos na mera manifestação de intenções a conversa será boa mas não passa disso ou, como dizia um velho e reconhecido investigador quando as "coisas" durante uma investigação começavam a enrolar-se, "…gasta-se tudo em preparativos como a feira de Mirandela". É isto!

Por decisão pessoal, o autor escreve segundo o antigo Acordo Ortográfico.
NewsItem [
pubDate=2020-09-17 16:43:45.0
, url=https://www.sabado.pt/opiniao/convidados/detalhe/conversa-de-ocasiao
, host=www.sabado.pt
, wordCount=529
, contentCount=1
, socialActionCount=0
, slug=2020_09_17_540685969_conversa-de-ocasiao
, topics=[opinião, convidados]
, sections=[opiniao]
, score=0.000000]