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Quem diria que um dia todos iríamos ser aprendizes de Microbiologia?

Quem diria que um dia todos iríamos ser aprendizes de Microbiologia?

É isso que estes tempos de covid-19 nos pedem. No curto prazo, que aprendamos a lidar com o vírus invisível. No médio-longo prazo, que reflictamos, individual e colectivamente, sobre formas de melhorar a nossa organização e interacção com o planeta

Hoje é o Dia Internacional do Microrganismo. Uma homenagem ao curioso Anton van Leeuwenhoek que, no século XVII, apostou na engenharia de lentes para espreitar o mundo invisível.

Observar foi só o primeiro passo para saber que existiam micróbios! O conhecimento que a partir daí se foi consolidando ao longo dos séculos gerou uma revolução importante na ciência. É, aliás, um belo exemplo de como o conhecimento destrona crenças e preconceitos. Por exemplo, foi através da Microbiologia que caiu a crença tão enraizada de que os seres vivos podiam surgir por geração espontânea.

Em múltiplas ocasiões ao longo da História, o conhecimento adquirido em Microbiologia contribuiu também para compreender como o desrespeito pela natureza representa uma ameaça à humanidade. Por exemplo, a invasão e interferência com a vida selvagem que pode abrir verdadeiras caixas de Pandora com a libertação de micróbios que, por vias sinuosas e com taxas de propagação mais ou menos altas, acabam por vir a causar doenças em humanos. Ou ainda, a invasão e colonização de comunidades humanas indígenas que pode levar consigo pragas devastadoras de um povo, como terá acontecido quando o Velho Continente descobriu o Novo Mundo. Já para não falar dos riscos de contágio por doenças infecciosas, tão elevados e dizimadores em regiões pobres e profundamente desestruturadas, em que a falta de saneamento faz confundir água de consumo com esgoto. Esta é uma realidade, infelizmente, ainda muito presente em diferentes zonas do globo, desde alguns campos de refugiados a várias regiões da Ásia ou de África. Todos estes são temas que cruzam a microbiologia com a sociedade e com o (des)respeito pela natureza.

Os micróbios patogénicos são importantes sinais de alerta de quando algo não vai bem, funcionam como um barómetro das agressões ambientais ou das grandes ameaças sociais. Há uma parte do mundo, por exemplo aquela onde nos encontramos, que tende a ignorar estes sinais de alerta. Porém, esta terrível e incómoda pandemia veio mostrar-nos uma das mais notáveis propriedades dos micróbios – viajam connosco e propagam-se rápido!

E foi assim que, um dia, todos acordámos a precisar de ser aprendizes de Microbiologia.

que habitamos.

Lidar com o vírus invisível parece complicado, mas aprende-se. Faz lembrar uma primeira aula de laboratório de Microbiologia em que se diz aos estudantes que os microrganismos estão em todo o lado – sobretudo, em tudo o que tocam e no ar que respiram. Avisamos que cada vez que tocam em algo deixam lá uns micróbios e trazem outros colados às mãos, e que cada vez que inspiram captam uns micróbios do ar e ao expirar lançam outros tantos cá para fora. É só isto que todos precisamos de interiorizar e agir em conformidade – usar a máscara para evitar a lançar ou receber micróbios para e dos que nos rodeiam e lavar e desinfectar as mãos e as superfícies inanimadas com muita frequência.

Afinal, o que parece tão complicado é até simples! Sobretudo, se se comparar com o que precisamos de mudar a médio-longo prazo. Essa mudança exige uma revolução, séria e profunda. Como afirma o Papa Francisco na Encíclica Laudato Si’, vivemos uma crise de ecologia, a disciplina que estuda as relações entre os organismos vivos e o seu ambiente. Segundo afirma, a mudança “exige sentar-se a pensar e discutir acerca das condições de vida e de sobrevivência duma sociedade, com a honestidade de pôr em questão modelos de desenvolvimento, produção e consumo. Nunca é demais insistir que tudo está interligado.”

De Anton van Leeuwenhoek à covid-19 aprendeu-se tanto e ao mesmo tempo tão pouco… está na altura de voltar a olhar para o que nem sempre é visível!

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